domingo, julho 23, 2006

REPÚBLICA E VIOLÊNCIA: PCC NA CRISE DA SOCIEDADE

Folha de ontem, por Walter Cenveviva

Atribuir os fatos apenas à inépcia dos governos não parece razoável. A inépcia é somente um dado a mais


SE OS BATALHÕES e regimentos sob o Primeiro Comando da Capital existirem, conforme o dia-a-dia do noticiário sugere, devemos perguntar-nos como foi possível sua criação e, depois, avaliar como o Estado lhes pode contrapor sua força. Atribuir os fatos deste ano apenas à inépcia dos governos não parece razoável. A inépcia é só um dado a mais. Se hoje, perguntado ao povo se é melhor construir um hospital ou uma prisão, a resposta estatística favorecerá o hospital. O fenômeno social mais evidente na busca das causas do crime organizado está, contudo, na reduzida probabilidade da punição generalizada dos que delinqüiram. A enorme demora que alguns julgamentos mais notórios provocam, a duvidosa punibilidade de alguns culpados, acentua o mito da lei igual para todos.

No plano social, há outro ponto importante. Ao menos nas grandes cidades, o crime parece oferecer aos jovens mais esperança de uma vida melhor. Vida difícil ou impossível de conseguir (na visão deles) por outro meio, com escolaridade insuficiente, famílias mal compostas, pais ausentes na tarefa de ganhar o sustento. Os elementos negativos se reforçam com os "heróis" dos mensalões, dos sanguessugas não punidos e, talvez, não puníveis. Também se reforçam com o diferente tratamento dos que têm meios em face dos que não os têm. O leitor dirá, com razão, que sempre foi assim.

Considere, porém, que na época da comunicação eletrônica, a distorção foi ampliada. Exemplo: todos sabem que o chefe do grupo seqüestrador de Washington Olivetto, apesar de uma condenação pesada, já está em regime semi-aberto. Ou seja: a longa condenação foi uma espécie de blefe, que a realidade não confirmou.

Sob outro ângulo generaliza-se a convicção, embora nem sempre justa, de que a cadeia e a repressão existem sim, mas não para os bacanas, que a dureza do direito é reservada para alguns segmentos da sociedade. Os outros são acumulados em prisões sem espaço, com raras hipóteses de recuperação viável. As alternativas são as da criminalidade mais violenta.Nesse estado de coisas a sociedade se divide. Há os que reclamam repressão mais vigorosa. Há os que reclamam melhores condições de tratamento para os condenados. Nenhum dos extremos tem toda razão. Insistindo no tema: o ideal do equilíbrio é o da certeza da punição dos culpados e o da preservação dos inocentes.

Isso exige do Estado, policiais capacitados, bem pagos, não corruptos, providos de apoios técnicos modernos. Apoios que a televisão vem mostrando em várias séries norte-americanas e inglesas, com a ação da polícia científica, das autópsias às perícias.

A injustiça social sugere que o levantamento da opinião do povo, mesmo entre os que nunca delinqüiram, aponta no sentido de quase total desconfiança em face da máquina do Estado.

Pensando a crise em termos do ocorrido com a criminalidade organizada, é bem evidente a influência do poderoso influxo psicológico e social para afirmar que a solução nunca será definitiva, destinada a melhorar os caminhos do equilíbrio no controle da criminalidade nos quais a proteção e punição sejam perceptíveis e eficazes.

O primeiro passo é recompor a confiança da comunidade, mostrando que o crime não compensa. Esse é o papel imediato do Estado.

Marcadores:

Google
online
Google